21 de outubro de 2011

Onde está o filósofo na alegoria da caverna?

Na alegoria da caverna de Platão, o prisioneiro recém-libertado e que consegue ascender até à realidade exterior, descobrindo a ilusão e a mentira em que tinham vivido até aqui, decide regressar ao interior da caverna, até junto dos seus antigos companheiros. É evidente que se previa que estes, quando ouvissem o relato do outro, não fossem acreditar e aceitar as suas palavras, antes se rissem, achassem que ele estava maluco e, pudessem até ter uma reação violenta e matá-lo.
Ora, todos nós sabemos que Platão, com este prisioneiro peculiar, pretende evocar a figura do filósofo e, concretamente, o seu mestre Sócrates. Afinal, não fora este também vítima da incompreensão dos seus contemporâneos, os não-filósofos, acabando por ser condenado à morte sob a acusação de querer corromper a juventude? E é também a figura do filósofo que está em causa nesse regresso ao interior da caverna. Com efeito, como se pode justificar que regresse ao interior frio e escuro dum mundo desagradável, um mundo agreste de ilusões e mentiras? Como compreender que o prisioneiro recém-libertado não opte por ficar no seio da realidade acabada de descobrir, uma realidade mais rica, luminosa e colorida, onde se pode viver uma vida melhor e mais autêntica? Como perceber que ele abandone tudo isso e esteja até disposto a ser vítima da zombaria dos outros,a  ser coberto de ridículo e mesmo ver a sua vida ameaçada, senão mesmo morrer às mãos dos seus antigos companheiros? Porque é que está disposto a correr tantos riscos?

Também a resposta a estas perguntas aproxima-nos o seu comportamento da figura do filósofo. Ele está disposto a perder a sua vida, porque o compromisso com a verdade é mais forte. E, sobretudo, mais forte o dever de comunicar a verdade, esclarecer os seus semelhantes, explicar-lhes que existe uma outra realidade, um outro mundo e um caminh que a isso nos pode conduzir. O filósofo, preocupado com a condição humana, tem um dever para com os homens. Em nome desse compromisso está disposto a arriscar a sua vida. É mesmo filósofo!... 

1 comentário:

  1. Mas que sabe esse filósofo? Sabe o caminho para a verdade, mas como a verdade é de uma natureza diferente da aparência não consegue transmiti-la em «linguagem de aparência». Morrer é a sequência dessa impossibilidade. Então, escapando a esse destino, ou se refugia na contemplação da verdade inefável e torna-se eremita sem pretender mudar o status quo, ou toma o poder e governa: que é a maneira de impor a verdade sem ter que a justificar (se ela é indizível então nada há para dizer, quem a conhece governa (Platão)). O resultado histórico desta última tese tem sido mais ou menos trágico. Mas isso só quer dizer que há quem acredite que alguém conhece essa verdade e essa é, em última análise, a verdadeira razão da tragédia. Luís Ladeira

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